Espinha dorsal do argumento dos neoliberais brasileiros, de Paulo Guedes à Rede Globo, de Fernando Henrique à Rede Record, a teoria de que temos um Estado gigantesco que precisa desinchar é uma falácia.
Argumentam com o percentual do PIB que é arrecadado pelo Estado e dizem que outros países com Estados mais eficientes custam proporcionalmente menos. Além de não ser verdade, parece que esquecem de relativizar os números em função do tamanho das populações.
Com a indispensável colaboração da minha assessora de orçamento, a economista Talita Araújo e sugestões do também economista Plinio Jr., fiz uma tabela com alguns dados dos cinco países com melhor Índice de Desenvolvimento Humano, os EUA (oitavo IDH) e o Brasil (75ª posição).
Na coluna B está o PIB de cada país. Na coluna C, as despesas do Estado como percentual do PIB. Na coluna D, a participação do gasto com Juros pelo Governo Central no PIB. Na coluna E, o percentual que representa o tamanho do Estado descontado o gasto com Juros no PIB. Na coluna F a população. Na G o PIB per capita. E finalmente na coluna H, o que quero demonstrar: quanto cada um desses Estados gasta por ano por habitante, ou em outras palavras, o “Estado per capita”. Na coluna I a correção do “Estado per capita” descontando os gastos com juros, apresentados na coluna D.
Destes seis países com qualidade de vida bem melhor do que a nossa, quatro possuem tamanho relativo do Estado maior que o nosso e dois são menores. O país com o maior Estado relativo é a Dinamarca, quarto IDH, consumindo 56,66% do PIB. A campeã do IDH, a Noruega, gasta 44,22% do PIB com o Estado. No Brasil o Estado fica com 37% do PIB.
A situação fica mais clara quando dividimos os gastos do Estado pelo tamanho da população. Aí o Brasil perde de goleada. Gastamos 3.735,99 dólares por habitante por ano. A segunda colocada no IDH, a Austrália, gasta US$ 21.598,86 e a Noruega, gasta US$ 33.276,13. Ou seja, a Noruega gasta quase 9 vezes mais do que o Brasil. E os EUA gastam quase 7 vezes mais do que o Brasil.
E tudo piora mais ainda quando descontamos do “Estado per capita” os gastos com os juros da dívida pública. A Noruega fica com gasto 11 vezes maior que o do Brasil, que fica com apenas 2844,44 dólares por habitante/ano.
Qualquer projeto político que tenha como base enxugar o Estado brasileiro terá como resultado aumentar a pobreza e a miséria.
Por outro lado, também demonstra a inviabilidade do Estado de Bem-Estar Social, impossível de ser financiado por um PIB per capita tão baixo. Pois mesmo que todo o nosso PIB fosse para o Estado, seria menos da metade do que a Austrália dedica do PIB ao seu.
Esse é o nosso drama, enquanto aceitarmos ser condenados à feitoria moderna na periferia do sistema capitalista global teremos que conviver com a pobreza e miséria da maioria.
A situação é muito mais complexa do que tentam resumir as palavras de ordem da direita ou da esquerda.
Não iremos avançar se o caminho for o liberalismo de Bolsonaro e Paulo Guedes.
Também a esquerda que propõe a domesticação do capitalismo brasileiro através do Estado do Bem-estar está vendendo ilusões.
Somente profundas e radicais mudanças nas estruturas das nossas relações sociais, políticas e econômicas internas e externas podem construir um futuro decente para o nosso povo. O problema é muito difícil de resolver, pois exige ruptura da atual ordem econômica mundial. Porém, a alternativa é a eternização da nossa barbárie diária.
Em tese, teríamos duas opções possíveis. A primeira é sair da periferia e ir para o centro da economia capitalista. Esse caminho se demonstrou historicamente inviável. Isso porque faltou vontade do centro de aceitar novos sócios no clube e a nossa burguesia sempre foi subordinada à burguesia dos países centrais. Além disso, há hoje um obstáculo adicional: a crise ambiental, que impede que os países pobres sigam o modelo de desenvolvimento predatório dos países ricos.
A segunda escolha é a ruptura com a ordem capitalista e a construção de uma nova sociedade. Ela comporta os riscos de toda Revolução. Porém, conhecendo a história dos últimos dois séculos somos capazes de saber que o Estado do Bem-Estar Social nunca se viabilizou política e economicamente em nenhum país da periferia do sistema e que Revoluções Socialistas ocorreram muitas, a ponto de nos anos oitenta mais da metade da população mundial habitar os países ditos socialistas.
Ecossocialismo Libertário
Diante das ameaças do governo de extrema-direita precisamos debater e organizar a resistência aos ataques aos direitos da classe trabalhadora, ao meio ambiente e às liberdades democráticas.
Porém, também precisamos debater e organizar alternativas para o país (e o mundo).
Três pontos essenciais para eu optar pelo Ecossocialismo Libertário:
1- A atualidade da luta anticapitalista. O reconhecimento da impossibilidade do sistema capitalista de prover o bem-estar do povo e o respeito ao meio ambiente.
2- A autocrítica do desenvolvimentismo. O reconhecimento de que as condições de reprodução da vida humana estão ameaçadas pela produção industrial capitalista e que precisamos construir um novo modo de viver, socialmente justo e compatível com a preservação do meio-ambiente.
3- A autocrítica do autoritarismo. O reconhecimento de que sonhos não se constroem a partir de pesadelos. O regime socialista deve ser radicalmente democrático e absolutamente comprometido com a liberdade e com a democratização das relações em todas as esferas: na política, na economia, na cultura.