A questão do campo no Brasil mudou muito a sua configuração nas últimas cinco décadas. O antigo latifúndio improdutivo cedeu, em boa parte, lugar para a produção capitalista no campo, o chamado agronegócio, que são grandes empresas multinacionais e nacionais. Nestas transformações, o antigo “Coronel”, assistencialista e com dominação direta sobre os trabalhadores, cedeu o lugar para “patrões capitalistas” que mal conhecem seus empregados. Mas o pequeno produtor camponês continua a produzir grande parte dos alimentos e com pouco apoio do poder público. Lênin dizia que o camponês necessitava “explorar” a sua família e a ele próprio para colocar alimentos no mercado.
Os alimentos continuam sendo produzidos, basicamente, pelo pequeno trabalhador camponês ou pelo agronegócio. Mas lembremos que o campo é muito diverso e esta diversidade deve estar contemplada ao repensarmos as ações que devem ser desenvolvidas sob uma proposta popular socialista. Lembrando que, atualmente, o Estado, o poder público, não tem nenhuma ação direta na produção de alimentos no Brasil. O Estado apenas financia o pequeno ou grande privado. Mas podemos contribuir com o debate formulando algumas propostas.
Mas antes, um aparte: Conheci, junto com minhas alunas da Faculdade e Educação da UFMG, o Acampamento Maria da Conceição, situado em Betim. A terra é registrada em nome de Eike Batista e a ocupação, hoje, deve ter pouco mais de três anos. Os ocupantes eram moradores da periferia, favelas, de BH e Betim. Agora estão muito organizados. A Ocupação é bem cuidada, limpa, com as atividades sendo debatidas e divididas entre os moradores. Fazem uma pequena produção orgânica. A única construção de alvenaria é uma sala de aula. Construída por eles mesmo, muito simples, mas eles sentem muito orgulho. O interessante é que boa parte da sociedade, insuflada pela mídia e setores dominantes do capital, enxergam as ocupações de terras como um problema. Mas saliento que eles próprios estão dando uma das soluções para seríssimos problemas sociais e não “criando problemas”. Ou seja, dentro do sistema estão apresentando alternativas, mas mesmo assim encontram mil barreiras.
Agora, um pequeno esboço em alguns pontos de propostas para debate. Lembrando que o campo é bastante complexo e aqui serão listados apenas alguns pontos fundamentais:
1 – O CINTURÃO URBANO E HORTAS URBANAS:
O primeiro ponto seriam os cinturões urbanos e as hortas urbanas. Com todo o apoio do poder público, deveriam ser incentivados estes cinturões. O Estado desapropriaria as terras necessárias no entorno das cidades e os trabalhadores, com todo o apoio necessário, produziriam, principalmente, verduras e legumes de forma orgânica ou o mais próximo do orgânico. Poderiam ajudar a abastecer as cidades e as escolas, em particular. Ao mesmo tempo, oferecer trabalho e dignidade para os trabalhadores desempregados ou subempregados e que se encontram à margem nas cidades.
2 – GRANDE PRODUÇÃO ESTATAL:
Como segundo ponto, teríamos de cobrar a que o poder público assuma as produções mais complexas, através de fazendas que utilizassem as modernas tecnologias. Seria necessário um enorme controle do agrotóxico aplicado ou, sendo possível, até a eliminação progressiva deste. Poderiam se especializar em grãos, cereais e grandes animais. Os trabalhadores seriam bem assalariados pelo Estado. Seria uma nova estatal, a Alimentobras, mas com bastante controle dos trabalhadores. As fazendas “agroecológicas” de arroz do MST no Sul do Brasil poderiam ser uma referência. A preocupação ecológica seria uma constante.
3 – CAMPONÊS:
Um terceiro eixo seria o apoio ao agricultor camponês. Principalmente apoio ao cooperativismo, com o estado entrando com assistência técnica, sementes e máquinas adaptadas ao pequeno produtor. O cooperativismo deveria ter um caráter social de forma a que o camponês se educasse no trabalho coletivo.
4 – OUTRAS ALTERNATIVAS:
Incentivar os grupos que quiserem trabalhar com diversas alternativas aos modos dominantes, como a permacultura, produção em florestas naturais, etc, Toda a produção agrícola que não seja para o capital, para o alimento como mercadoria, deve ser apoiado.
AMAZÔNIA:
Em primeiro lugar, demarcar e respeitar os territórios indígenas. Em segundo lugar, não esquecer que ali habitam muitos povos que vivem em situação de pobreza. Mas não adianta tentar “desbravar” a Amazônia com madeireiros ou “novos povoamentos”. Todas as vezes que estes métodos foram tentados, resultaram em problemas ecológicos e mais problemas sociais. Devem ser buscadas as explorações cooperativas com os trabalhadores locais e, num nível macro, a pesquisa da biodiversidade da floresta.
PESQUISA:
Incentivar a pesquisa universitária para o desenvolvimento de insumos que possam substituir as multinacionais do agrotóxico e incentivar a produção de máquinas adequadas que tornem a produção mais eficiente e o trabalho mais leve.
As alternativas elencadas encontram-se no campo de organização do trabalho, por isto políticas fundamentais como saúde, lazer ou educação formal ficarão para outro artigo. A sociedade, os movimentos sociais e sindicais, técnicos, pesquisadores e consumidores seriam chamados a debater a forma de trabalho e produção que melhor atendessem aos interesses dos trabalhadores e das classes populares, que teriam prioridade absoluta. Precisamos repensar a questão agrária e agrícola nestes novos tempos.